19.5.05

REFLEXÃO SOBRE O DIA DOS AÇORES


1. As circunstâncias conjugaram-se com outros calendários, a que as próximas eleições não são alheias, para que a comemoração do dia dos Açores fosse celebrado em Santa Maria. Saúdo o princípio da descentralização das comemorações pelas ilhas dos Açores, como forma de levar às mais afastadas e pequenas parcelas da Região a celebração da nossa identidade colectiva, como povo e região política.
2. A presença do Presidente da Assembleia da República – um açoriano, por sinal – é motivo de justificado orgulho, porque significa identificação do Estado com o processo autonómico, sem que tal identificação – do lado dos Açores – deva ou possa significar a anulação do carácter sempre reivindicativo da Região face a Lisboa, pois, os processos de descentralização política caracterizam-se sempre por uma tensão dialéctica entre as periferias e o centro. Quando essa tensão desaparece, é porque os protagonistas dos processos autonómicos decidiram meter a Autonomia na "gaveta"!
3. Não posso deixar de lamentar o papel subalterno da Assembleia Legislativa nas comemorações do dia dos Açores: nem o parlamento realizou uma sessão solene - nem este ano, nem em anos anteriores – na qual deveria ter usado da palavra o Presidente da Assembleia da República, nem sequer o Presidente do Parlamento usou da palavra na sessão comemorativa, no Cinema do Aeroporto, em Santa Maria. Lamentando esta prática, rejeito a subalternização evidente do parlamento face ao Governo Regional!
4. Apesar do correr dos anos, ainda muitos – a começar por altos responsáveis políticos – confundem o dia dos Açores com a celebração da Autonomia, enquanto sistema de auto-governo. A celebração do dia dos Açores contém em si própria, a comemoração da eficácia deste sistema de auto-governo, mas não se esgota nele ou sequer se confunde com ele. Na segunda-feira do Espírito Santo celebramos as marcas do Espírito em nós e a afirmação da nossa idiossincrasia enquanto povo. Vincamos a açorianidade que, do ponto de vista constitucional serve de fundamento à autonomia e que do ponto de vista histórico, social e cultural nos distingue dos restantes portugueses.
5. A celebração do dia dos Açores não é confundível, também, com uma simples opção de desenvolvimento, muito embora a experiência de auto-governo tenha arrancado os Açores dum atraso secular e permitido realizar uma obra em favor das pessoas que o poder central sempre recusou. O dia dos Açores, na segunda-feira do Espírito Santo invoca a unidade destas ilhas, numa data em que por todo o lado, onde houver um açoriano, se fala de devoção, de fé, de vontade e de querer.
6. Poderá parecer quase inútil falar de unidade dos Açores, mas nunca é demais recordá-la como uma das mais incisivas conquistas da jovem Autonomia açoriana. As ilhas, já unificadas no governo espiritual da Igreja, por meio da diocese de Angra e Ilhas dos Açores, experimentaram historicamente a divisão administrativa ao sabor dos interesses e das conveniências geo-políticas, ora da Coroa ora dos Governos republicanos. Após a derradeira experiência dos três distritos, a unificação política do governo das ilhas – primeiro sob a forma insípida e transitória duma Junta Governativa – e, depois, através dum Governo Regional, emanado duma assembleia parlamentar eleita por sufrágio directo, secreto e universal, é uma forma nova do exercício do poder.
7. A unidade dos Açores, como comunidade política organizada sob a forma de Região, tem resistido nestes quase trinta anos de auto-governo às manifestações de neo-barrismos perniciosos ou às derivas de governação – férteis nos últimos anos – que beliscam o equilíbrio desta unidade, construção de vontade férrea dum punhado de homens que há trinta anos ousaram ver para além do horizonte.
(Texto publicado no "Açoriano Oriental", de 18 de Maio de 2005)

11.5.05

A LIMITAÇÃO DE MANDATOS DOS PRESIDENTES DOS GOVERNOS REGIONAIS
A Autonomia político-administrativo dos Açores não é uma dádiva do poder central, mas uma conquista permanente, no confronto com as pulsões centralistas.

Nenhuma revisão constitucional, nenhuma alteração legislativa marca o fim do caminho da evolução da autonomia.

Os limites da Autonomia são fixados pela unidade do Estado e pela vontade dos Açorianos que aspiram – hoje como ontem – a um poder político próprio, capaz de satisfazer as históricas aspirações autonomistas, nas quais a Constituição da República recolhe fundamento para a definição matricial do sistema político autonómico.

Ainda recentemente, o Senhor Presidente da República, numa declaração equívoca, veio aos Açores dizer que a última revisão constitucional "sela de forma globalmente positiva um longo processo de evolução e maturação institucionais". Isto é, para o Senhor Presidente da República, o sistema autonómico dos Açores e da Madeira atingiu o seu limite de aprofundamento.

Engano o dele!

A Autonomia dos Açores avançará até onde os Açorianos quiserem, por muito que esse facto possa incomodar o poder em Lisboa, sempre à procura dum momento ou dum pretexto para reduzir atribuições ou competências, para travar as ambições de quem quer, legitimamente, mais.

A enunciação destes princípios poderá parecer um exercício inútil aos espíritos mais distraídos ou politicamente mais ingénuos.

Porém, todo o tempo é ocasião para reafirmar a defesa da Autonomia e para proclamar que a opção pela "livre administração dos Açores pelos Açorianos" não é uma figura de estilo perdida nos meandros das negociações com Lisboa, em que os oportunismos tácticos ou as solidariedades partidárias falam mais alto do que os princípios.

Quando enterramos os princípios em nome das conveniências, como alguns fazem, sacrificamos a defesa da Autonomia em nome da oportunidade passageira ou duma magra vantagem pecuniária atribuída pelo poder central.

Apesar do Presidente do PS/Açores ter declarado, na noite eleitoral de 20 de Fevereiro, que os socialistas açorianos adoptariam uma postura de exigência para com Lisboa, a verdade é que as circunstâncias se encarregam de desmentir – já - tal proclamação.

O Primeiro-Ministro, apresentado como "amigo dos Açores" é o primeiro a ofender competências constitucionais das Regiões Autónomas.

A proposta de Lei do Governo da República que estabelece limites à duração de mandatos de titulares cargos políticos, no segmento em que é aplicável aos Presidentes dos Governos Regionais é inconstitucional, por violação do artigo 231º, nº 7 da Constituição da República.

Esta proposta do Governo da República é um atentado à Autonomia Regional, praticado perante o silêncio cúmplice e envergonhado do PS/Açores.

Para que fique claro desde já, o PSD é favorável ao princípio geral da limitação dos mandatos dos titulares de cargos políticos.

A competência para estabelecer esse limite quanto ao Presidente do Governo Regional pertence aos Açores e não a Lisboa.

A duração do exercício de funções de Presidente do Governo Regional e os limites impostos à sua recondução é matéria que se integra no conceito constitucional de "estatuto dos titulares dos órgãos do governo próprio das Regiões Autónomas", como o configura o já referido artigo 231º, nº 7 da Constituição. Neste conceito cabem, nomeadamente, o regime de responsabilidade, os direitos, regalias, imunidades, estatuto remuneratório, incompatibilidades e condições ou regras para o exercício da função ou cargo.

Do confronto do disposto no artigo 164º, alínea m) com o disposto no artigo 231º, nº 7 da Constituição, resulta que é competência exclusiva da Assembleia da República legislar sobre o estatuto dos titulares dos órgãos de soberania e do poder local, cabendo às Assembleias Legislativas legislar sobre o estatuto dos titulares dos órgãos do governo próprio de cada Região Autónoma, em sede do respectivo Estatuto Político-Administrativo: no nosso caso, no artigo 68º.

A iniciativa de revisão do Estatuto Político-Administrativo pertence em exclusivo a esta Assembleia Legislativa, o que significa que apenas esta Câmara e, somente esta, pode determinar a oportunidade de rever o Estatuto Político-Administrativo, como dispõe o artigo 226º, nº 4 da Constituição.

Lembro aqui, a circunstância de estar em curso o trabalho de revisão do nosso Estatuto, no âmbito duma Comissão Parlamentar Eventual, constituída para o efeito. É aí, num primeiro momento, a sede para a discussão da limitação das condições do exercício do mandato do Presidente do Governo Regional.

Mesmo que pudessem subsistir dúvidas sobre a constitucionalidade da opção, haveria que resolvê-las em favor da Autonomia, na defesa das competências regionais, ao contrário do que faz o PS.

Para o PSD seria bem mais fácil acompanhar a posição dos socialistas, encarando a regra da limitação dos mandatos para os Presidentes dos Governos Regionais com oportunismo eleitoral.

Não o fazemos, porque, para nós, a defesa da Autonomia e dos Açores, estão acima de tudo.

Mais uma vez, podendo escolher entre os Açores e Lisboa, o PS prefere Lisboa.

A "autonomia cooperativa" – bandeira do relacionamento entre Carlos César e António Guterres e doutrina ideológica da "nova maioria" socialista – representou a negação do carácter reivindicativo nas relações com Lisboa, num período de anulação dos Açores face ao poder central.

Três meses depois das eleições, o PS capitulou face a Lisboa e reedita uma nova versão da velha “autonomia cooperativa”.

O comportamento do Partido Socialista é revelador do que se pode esperar nos próximos quatro anos.

Podendo ser um príncipe da Autonomia, o PS prefere ser um pajem do centralismo.

Por seu lado o PSD, continuará, como sempre, na primeira linha da defesa da Autonomia, sem necessidade de proclamar, a cada momento, a sua vocação autonomista.

Ao contrário do que se passa com outros, o nosso passado fala por nós!
(Declaração política feita na Assembleia Legislativa da Região Autónoma dos Açores, em 10 de Maio de 2005)