18.2.09

GOVERNAÇÃO E MÁSCARAS DE CARNAVAL

Os caminhos tortuosos da saúde dos açorianos – Carlos César enalteceu, este fim-de-semana, a actuação do seu governo na área da saúde, salientando o número de médicos especialistas ao serviço dos Hospitais da Região. Porém,a realidade é bem diferente. Dados oficiais estimam que são necessários mais 60 médicos de medicina geral e familiar para satisfazerem as necessidades de cuidados primários de saúde dos açorianos. A decisão da Câmara Municipal da Lagoa de proporcionar aos seus munícipes consultas de medicina geral e familiar, investindo uma parte do seu orçamento, é o reflexo do insucesso da política de saúde socialista ao nível dos cuidados primários. A Câmara da Lagoa substitui-se à Região na prestação de cuidados de saúde, reconhecendo uma incapacidade crónica de decisão política.

O estatuto da carreira docente – O estatuto da carreira docente custou a Álamo Menezes o lugar de Secretário Regional da Educação. A sua substituição por Lina Mendes foi o início duma estratégia para um recuo governamental nas políticas governativas seguidas mais por teimosia, do que por utilidade. O Governo Regional chegou ao debate do estatuto da carreira docente duplamente derrotado: aceitou agora o que nunca desejou e cedeu mais do que pretendia. As insuficientes alterações que o Governo Regional introduziu neste diploma, são o primeiro funeral das políticas de Álamo Menezes. Certamente que outros se seguirão.

Milhões incertos – A enorme dívida da SPRHI – cerca de 117 milhões de euros – o buraco financeiro da SAUDAÇOR, que levou já o PP a pedir a sua extinção, obrigam a uma reflexão séria sobre a dimensão, utilidade e interesse público na empresarialização do Estado. Há uma pesada factura que se começa a acumular, condicionando a execução financeira da Região nos próximos anos.

Chávez for ever? – O referendo constitucional realizado na Venezuela e que permitiu a Chávez remover as limitações constitucionais à reeleição presidencial abriu portas para a sua perpetuação no poder. Um regime presidencial, sem limite quanto à reeleição, degenera para um regime ditatorial. Os sinais estão lá todos nos tiques “chavistas”, que alguma esquerda portuguesa aprecia. Umas vezes com Magalhães outras sem…
PUBLICADO NA EDIÇÃO DE HOJE DO AÇORIANO ORIENTAL

17.2.09

AS CRISES DO SERVIÇO PÚBLICO DE TELEVISÃO

O serviço público de rádio e televisão nos Açores atravessa um momento de profunda crise, resultado duma permanente indefinição estratégica quanto ao âmbito e extensão das obrigações de prestação do serviços público, da escassez de meios financeiros, humanos e materiais e duma errática solução organizativa, que gerou mais conflitos do que trouxe benefícios.

O Estado, de modo sistemático e reiterado, já demonstrou que o Centro Regional dos Açores da RTP não constitui uma prioridade empresarial, ao não dar – como é sua obrigação – instruções, como único accionista, à RTP, SA para dotar a estrutura dos Açores dos meios que lhe permitam desempenhar com suficiência as obrigações de serviço público de rádio e de televisão.

O Governo Regional dos Açores, apesar das posições políticas tomadas na Assembleia Legislativa, em audições ao Director da RTP/A, em debates de avaliação sobre a prestação das obrigações públicas em matéria de rádio e televisão ou através de Resoluções que reclamam para os Açores melhores meios, mais produção regional - no melhor e mais televisão e rádio – já demonstrou não ter capacidade política para conseguir mais de Lisboa.

O momento de instabilidade que a RTP/Açores atravessa, ao contrário do que os mais desatentos possam querer afirmar, não é provocado a partir do exterior, antes resultando da confusão e indefinição no seio do próprio prestador do serviço público.

As “migalhas que o Centro Regional tem recebido do Conselho da Administração”, na expressão do Director da RTP/A, ontem mesmo, na audição parlamentar, bem como a criação dum Gabinete que serve de intermediário entre os centros regionais e a administração da RTP, são actos de asfixia da rádio e televisão públicas nos Açores.

Há uma exigência política que se impõe de imediato: o reforço dos meios financeiros atribuídos à RTP/A, que não passa sequer pela sua inclusão nos projectos de interesse comum previstos na Lei das Finanças Regionais. Basta, sim, um simples acto de vontade política do Governo da República, com tradução numa decisão administrativa da RTP.

O Governo da República e o Governo Regional dos Açores pela sua omissão, estão a assassinar o serviço público de rádio e televisão nos Açores.
PUBLICADO EM 11FEVEREIRO DE 2009 NO AÇORIANO ORIENTAL

16.2.09

BANDEIRA E TEIMOSIAS DE ESTADO

A reforma do Estatuto Político-Administrativo da Região Autónoma dos Açores concluída com a publicação Lei nº 2/2009, de 12 de Janeiro, foi um processo de afirmação identitária da autonomia dos Açores.

Depois da querela a propósito dos artigos 114º e 140º, o país assiste à reedição duma nova “guerra das bandeiras”, envolvendo as Forças Armadas, a propósito do direito atribuído à Região Autónoma dos Açores de ter a “bandeira da Região hasteada nas instalações dependentes dos órgãos de soberania” (artigo 4º) no território dos Açores.

Esta norma do Estatuto é conciliável com a soberania do Estado e com a expressão constitucional do papel das Forças Armadas e não confunde aquele direito com uma eventual obrigação de utilização da bandeira dos Açores em cerimónias militares, de todo ausente da Lei estatutária.

As declarações do Ministro da Defesa Nacional preconizando que não haja “nenhuma alteração no exterior dos quartéis, onde se mantém hasteada a bandeira nacional” revelam um estranho preconceito quanto à utilização da bandeira dos Açores.

Lembro, a este propósito, que os Tribunais – órgãos de soberania - instalados no território dos Açores hasteiam a bandeira açoriana no seu exterior, sem que tal facto suscite discussão ou emoções peregrinas.

A discussão sobre a bandeira dos Açores, nos termos em que é feita na comunicação social, tornou-se num exercício tão inútil, quanto espúrio: a Lei de revisão estatutária é uma Lei que obriga todos os seus destinatários, a começar pelos titulares dos órgãos de soberania.

Mantenho a convicção quanto à constitucionalidade das normas aprovadas pela Assembleia da República, concedendo que a natureza dalgumas delas é “praeter” Constituição.

A Região Autónoma dos Açores optou por iniciar uma ampla revisão do Estatuto, explorando os novos caminhos abertos pela revisão constitucional de 2004, que admite um diferente figurino institucional e competencial para cada uma das Regiões Autónomas. Direi que, neste domínio, os Açores adoptaram a doutrina Sinatra do “my way”.

O controlo público, político e jurisdicional a que foi sujeita a proposta de Lei de reforma estatutária, transformando a sua aprovação num dos actos legislativos mais escrutinados de sempre nos últimos anos - contribuiu para reconfirmar o carácter inovador e reformista de muitas das suas soluções, reflectindo as opções políticas do povo açoriano, “este povo que nasceu do mar”, no verso feliz de João de Melo.

O processo de autonomia regional é de aprofundamento gradual e progressivo, no quadro do Estado que é de facto um Estado regional e já não um “Estado unitário”, como ainda o define a Constituição. A Lei Estatutária não representa, por isso mesmo, o fim dum percurso, antes perspectivando novas soluções constitucionais, que a querela a propósito desta última revisão não deve afastar.

Uma futura revisão constitucional deve contemplar uma alteração da natureza do Estado para Estado regional e a criação duma nova categoria de Lei – a Lei Estatutária – reservada à aprovação ou revisão dos Estatutos das Regiões Autónomas, constitucionalizando o seu papel paramétrico.

Daremos, assim, um novo e seguro passo no sentido da clarificação autonómica.
PUBLICADO EM 14FEVEREIRO2009 NO EXPRESSO