O discurso do Presidente do Governo Regional, na semana passada, em Rabo de Peixe, quando acusou as Câmaras Municipais de gastarem dinheiro em cantoras "brasileiras", ao invés de investirem na promoção da habitação social é revelador duma atitude política e dum comportamento institucionalmente desadequado. A intervenção sobre as "brasileiras" não pode ser interpretada à margem do que disse o Presidente do Governo na sessão solene comemorativa do dia da Região: o chefe do executivo, não só continua a confundir o seu papel institucional de Presidente do Governo com o de líder partidário, como resiste cada vez menos à tentação de desqualificar os outros poderes fácticos da sociedade açoriana, sobretudo os que estão legitimadas por meio do voto popular. Com uma maioria confortável no parlamento, com uma liderança inquestionável dentro do Partido Socialista, com autoridade pessoal e política sobre todos os membros do seu Governo, o que pode levar Carlos César a comportar-se desta maneira, a dois anos de eleições? Em primeiro lugar, um certo incómodo de Carlos César com a função que desempenha. O líder socialista vê-se arrastado para um futuro que não desejou para si próprio: abundam os indícios – alimentados pelo próprio, antes de mais – de que poderá candidatar-se a um quarto mandato, o que o deixa desconfortável. Carlos César deixa que as circunstâncias lhe imponham um percurso que tanto criticou ao seu arqui-rival, Mota Amaral. Sem espaço político fora dos Açores, Carlos César perdeu a frescura política de outros tempos perante a encruzilhada do seu percurso. Em segundo lugar, o tempo demonstrou que o Presidente do Governo convive mal com a crítica ou com o poder de outros. As críticas da oposição têm acertado no alvo e o poder de outros leva-o a discursos despropositados – alguns dirão que é a sua natureza; acrescento que é a consequência do momento. As "brasileiras" do Governo não têm nomes melodiosos, nem dizem "oi", mas custam bem mais ao erário público: Transmaçor, SCUT’s, Portas do Mar, Kairós e tantas outras.
PUBLICADO NO AÇORIANO ORIENTAL EM 14 DE JUNHO DE 2006